Cultura em Planaltina-DF precisa de um
C.H.E.C.A.P: Queremos Patrimonialização sem Patrimonialismo
Historiador e Prof. Xiko Mendes
(Presidente da APLAC – Academia Planaltinense de Letras,
Artes e Ciências – fundada e ativa desde 1998).
Como o próprio termo indica, PATRIMONIALISMO deriva
das palavras patrimônio e patrimonial e
pode ser definido como uma concepção
de poder em que as esferas pública e privada confundem-se
e, muitas vezes, tornam-se quase indistintas. Assim sendo, um líder político
é qualificado como patrimonialista quando, ao assumir um cargo público, acaba
“instrumentalizando” a Administração Pública. Cria nela mecanismos
informais de controle clandestino da estrutura estatal para satisfazer
seus interesses particulares e agradar apenas seus aliados, prejudicando,
assim, a sociedade e os cidadãos que não comungam desses desvios de conduta
ética.
O Empreguismo (contratação
de funcionários sem concurso público); o “uso personalizado” de Repartições
Públicas (exemplo: Espaços Culturais Públicos
cedidos, informalmente, para uso com exclusividade ou monopólio
apenas para quem apoia o governo); a prática de irregularidades diversas
(exemplo: não punição de pendências junto ao Poder Público
em prestação de contas ao se receber dinheiro público ou
sonegar impostos) ferindo o interesse público conforme previsto no
Artigo 37 da Constituição Federal do Brasil, que condena tais práticas como
Improbidade Administrativa (cfe. Lei 8.429/92). Tudo isso aí é muito comum em
nosso país e traduz parte da escandalosa troca de favores entre
políticos e parte de seus eleitores, pois revela o típico estilo “para os
amigos, tudo; para os adversários, nada”.
Patrimonialismo é um conceito criado ainda
no século XIX por Max Weber. Sérgio Buarque de Holanda, em “Raízes do Brasil”
(1936), e Raymundo Faoro, em “Os Donos do Poder” (1958),
teorizaram entre nós esse conceito que bem se aplica às “Práticas não
Republicanas” tão voga em tempos de Operação Lava-Jato. Já PATRIMONIALIZAÇÃO é
o ato, efeito ou ação de tornar um bem com valor de PATRIMÔNIO CULTURAL
e social através do estudo, salvaguarda, preservação, conservação e divulgação. O Decreto-Lei 25 de 30/11/1937, aprovado por Getúlio
Vargas no mesmo mês no qual ele instituiu a Ditadura do Estado Novo, é bem
elucidativo do conceito elitista de patrimônio. Tal decreto só considera como
bem cultural do país aquele cuja vinculação a “fatos memoráveis da história
do Brasil” é comprovada com documentos.
A Lei federal 378 de 13 de janeiro de 1937
criou o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, hoje
IPHAN. Concebida e executada, em três décadas, pela dupla Gustavo Capanema
(1900-1985) e Rodrigo de Melo Franco Andrade (1898-1969), a Política
Pública de Patrimonialização de Bens Culturais (PBC) no Brasil,
na maior parte do tempo, privilegiou a preservação apenas de patrimônios
criados como “Legados dos Ricos ou da Igreja Católica”
(exemplo: Casarões como o do Museu de Planaltina - o que não é um problema
em si). Isso só mudou depois da Constituição de 1988 quando o Brasil obrigou-se
a assinar convenções internacionais que “deselitizaram” a visão sobre
Patrimônio Histórico-Cultural e sobre o que a Historiografia qualifica como
documento histórico.
Os decretos distritais 2.452 de 29/11/1973
(que criou o Museu Histórico e Artístico de Planaltina –
MHAP), 6.939 de 19/8/82 (que converteu o Perímetro ao redor desse Museu
como área tombada) e 7.010 de 7/9/82 (que fez o tombamento da Pedra
Fundamental), complementados com a legislação recente sobre Patrimônio
Imaterial (que inclui, por exemplo, a Festa do Divino e a Via Sacra), são
o Marco Legal da PBC planaltinense. Em nossa cidade há
uma “Gente Paladina da PBC” que se arvora em ser o “Paládio”
da Patrimonialização e quer dá a última palavra sobre o
assunto como se ninguém mais entendesse da matéria. E o quê dizer sobre outros
patrimônios não tombados? Debate sobre Patrimônio Cultural terá sempre como
epicentro o Centro Histórico (Setor Tradicional)? E a Rua Piauí (antiga Rua da
Palha)? E a Vila Vicentina? E as memórias interessantes dos pioneiros da Vila
Buritis, tema do livro do Professor Tibica? São tantas questões!?!
Esses Paladinos não conseguiram se
libertar do conceito elitista de Patrimônio. Olha aí três das várias
contradições explícitas: (1) Ao mesmo tempo em que são contra o Método
Genealógico de se estudar o Passado de Planaltina por meio de narrativas que incluem Famílias
Tradicionais Pioneiras dessa cidade, são a favor de se
valorizar o “Legado Patrimonial” que essas famílias ricas construíram para seus
descendentes e não para o povo. (2) Ao mesmo tempo em que negam a
historicidade linear-positivista (que privilegia “datas e personagens
marcantes”) – e também é uma forma de comprovar a sequência dos fatos
históricos – correm atrás de “versões maquiadas” e igualmente
positivistas do Passado por meio das quais tentam impor, como se com um
documento nas mãos (datado de 1700 e alguma coisa...),
pudessem explicar toda a diversidade social e cultural construída em solo
planaltinense. (3) Ao mesmo tempo em que lutam pela conservação e divulgação
desses Patrimônios (isso é motivo do meu aplauso!), insinuam o monopólio
da gestão de espaços culturais dificultando a acessibilidade por outros
usuários quando, informalmente, quer a exclusividade de uso desses espaços, o
que infringe o Artigo 248-XI da Lei Orgânica do Distrito Federal.
Todos os bens materiais tombados em Planaltina
(Museu, Pedra...) são, sim, Legados Culturais das Elites – e isso não é nenhum
demérito – mas os Paladinos precisam admitir isso publicamente! É contraditório querer ser “Paladino
da PBC” desrespeitando quem construiu esses Patrimônios e quem primeiro fez
pesquisas históricas sérias desde os anos 1970 sobre essa Planaltina
Subterrânea (1746?-1960), que havia antes de Brasília. As entidades
culturais da Sociedade Civil, que atuam em Planaltina, precisam juntas e
urgentemente, unir forças tanto contra “práticas não republicanas” de
uso de espaços culturais quanto pela ampliação da PBC em
nossa cidade. Qualquer relação entre essas entidades e o Poder Público precisa
ter natureza formal. É obrigatório respeitar e seguir o Decreto
Distrital 37.843 de 13/12 de 2016 em consonância com a Lei
Federal 13.019 de 2014 toda vez em que se utilizar desses
espaços. Para os “Patrimonialistas de Espaços Culturais Públicos”...
Exigimos o cumprimento da lei!!!
E é para cumprir essa legislação que ora
propomos à Administração Regional de Planaltina e a Secretaria de Cultura
(SECULT-DF) que aprovem portaria conjunta criando o CHECAP: Controle
Social da Humanização de Espaços Culturais em Áreas Públicas. Trata-se de
uma proposta com foco na fixação de critérios públicos e objetivos de: (1)
utilização multiuso dos espaços culturais públicos; e (2) humanização do acesso
e (3) com a previsão de INSTRUMENTOS
DE CONTROLE SOCIAL PARA AVALIAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM ESPAÇOS CULTURAIS
PÚBLICOS.
Como sugestão, entendemos que esse controle social pela
Sociedade Civil deve ser feito, ao mesmo tempo, pelo CONSELHO REGIONAL DE
CULTURA e pelo CONSELHO DO PATRIMÔNIO CULTURAL DE PLANALTINA. Propomos que o
controle seja praticado por meio de dois instrumentos: OSCAR
(Organograma Sociocultural para Controle de Agendamentos e Resultados) e PICUMÃ
(Plataforma de Informações Culturais sobre Utilização Multiuso de Espaços em
Áreas Públicas). Esse “OSCAR” deve ter, no seu
organograma, os seguintes elementos: Agenda LÍCITA (Locais
Indicados no Cronograma com Informações Transparentes sobre Agendamentos); GAIA (Guia
de Agendamento com Indicação de Atividades); RESMA (Relatório
Específico com Sinopse da Movimentação de Atividades); RUMOS (Relatório
Único para Monitoramento do Organograma Sociocultural); e I-CHECAP (Indicadores
de Controle Social da Humanização de Espaços Culturais em Áreas Públicas)
que AVALIE: Garantia de Acessibilidade (física e social); Respeito à
Diversidade (social e cultural); Descentralização Participativa e Transparência
mediante Controle Social no uso dos espaços culturais.
Desta forma, evitaremos tanto a visão patrimonialista na
Gestão dos Espaços Culturais Públicos quanto a centralização (monopólio,
exclusividade ou coisa que o valha) no uso deles. A luta pela patrimonialização dos bens culturais de
Planaltina assim como a construção contínua da consciência de pertencimento
tanto sobre eles quanto sobre a Cultura como um todo precisa ocorrer dentro do
estrito cumprimento da legislação de forma ética, transparente, democrática e
sem excluir nenhum dos atores sociais que protagonizaram a História do Povo
Planaltinense, inclusive as famílias tradicionais e seus historiadores como
Mário Castro, entre outros.
Nenhuma entidade cultural de Planaltina é mais importante que as outras. Por isso, qualquer privilégio informal ou institucional que o Poder Público do GDF vir a conferir a uma delas será, teórica e juridicamente, questionável junto a sociedade e à Justiça. Não aceitaremos que se "patrimonializem" (privatizem?) BENS CULTURAIS para usufruto privativo de quem quer que seja. Toda pessoa física ou jurídica tem direito de pleitear o uso dos espaços culturais públicos desde que
siga o arcabouço infraconstitucional válido para todos. Como já dissemos em
outra oportunidade, desde a Era Vargas que criou o IPHAN, não há usucapião de
coisa pública. Ninguém, sozinho, é usuário de Bem Público. Portanto, não há Simonia em bens públicos, pois tal prática,
comum na Idade Média, foi condenada pela Reforma Protestante.
Nenhuma entidade cultural de Planaltina é mais importante que as outras. Por isso, qualquer privilégio informal ou institucional que o Poder Público do GDF vir a conferir a uma delas será, teórica e juridicamente, questionável junto a sociedade e à Justiça. Não aceitaremos que se "patrimonializem" (privatizem?) BENS CULTURAIS para usufruto privativo de quem quer que seja.
OBS.: O presente artigo não reflete, necessariamente, a opinião dos associados
da APLAC, mas tão somente a visão do presidente enquanto apenas um de nossos
associados.
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